Texto: África Don Domênico

Texto: África Don Domênico

Prof. Mestre José Sobreira Barros Junior

APRESENTAÇÃO

O processo de análise de um campo científico, necessariamente, sempre apresenta aspectos diversos, principalmente quando parte-se para uma analise mais especifica e procura-se verificar como esse todo pesquisado alinha-se, contextualiza á realidade.
O objetivo deste trabalho é o de contextualizar as linhas existentes da historiografia africana e como é possível estes parâmetros da pesquisa, dos caminhos de analise historiográficos, tomados pelos historiadores africanos, possam de alguma maneira estar
presente nos nossos livros didáticos.
Como pesquisa é fundamental o desenvolvimento de dois processos, o primeiro deles, uma breve analise do debate historiográfico e como este apresenta-se localizado em termos de ciência e os principais pressupostos presentes no debate da historiografia.
O segundo, será uma pesquisa empírica em alguns livros de história, adotados no programa oficial do MEC, estes serão analisados no sentido de como as correntes historiográficos africanas, podem se apresentar ou não e de como estas estão contextualizadas dentro de especificidades culturais e históricas pontualmente diferentes
em vários aspectos, estão contextualizadas com a historiografia nacional presentes nos compêndios didáticos.
Por fim, o aprofundamento em relação as correntes historiográficas africanas, seu contexto histórico e os caminhos evolutivos, como as possibilidades desse processo historiográfico na realidade.
Em nosso pais, o livro didático tem uma tradição e porque não, apresenta e sofre pressão do mercado editorial como um todo, em geral na opinião de alguns pesquisadores é pelo livro didático onde encontramos a centralização curricular, fato pela não existência de um currículo nacional, temos os “parâmetros curriculares”, estes
vão adaptando as demandas didáticas no aspecto dos textos, a LDB e os currículos estaduais, como recente “Currículo Paulista”, cumprem funções também de procurar unificar e apontar caminhos curriculares, com suas normas e leis.
Em nosso pais, as leis numero 10. 39/03 e principalmente, a complementar 9.394, determina a obrigatoriedade da inclusão no currículo Oficial da Rede de ensino nacional toda a temática da História e Cultura Afro-Brasileira, assim, podemos ter a garantia da
inclusão da temática na estrutura livresca, com capítulos e textos complementares os mais diversos, sendo alguns aqui analisados.
Essa inclusão é algo novo, do século XXI, assim, supera-se a colocação Egito, Mesopotâmia, do estudo da antiguidade e o papel dos africanos no Brasil, sua luta contra a escravidão, a herança cultural e política.
Porém, sabemos o processo da lei, não garante como aplicação, principalmente em uma sociedade preconceituosa e conservadora onde a escola positivista foi marcante emnosso campo historiográfico.
Desta forma, uma nova perspectiva se abre e podemos com a pesquisa apresentar esses novos caminhos e interliga-los com as características da historiografia africana.

INTRODUÇAO

O trabalho tem como objetivo apresentar as correntes historiográficas do Continente Africano, sua relevância para o debate intelectual e caracterização da África, como um
Continente em constante mutação, formador de bases sociais e econômicas fundamentais para a história humana e sua riqueza civilizatória.
Ao mesmo tempo, faremos um breve cotejamento desta historiografia e sua influência nos livros didáticos, assim, poderemos perceber como esse processo de evolução
historiográfica é presente contemporaneamente em nossa realidade educativa, na base da sua formação no níveis básicos e médios.

PALAVRAS CHAVE

África, historiografia, livros didáticos.
The work aims to present the historiographical currents of the African Continent, its relevance to the intellectual debate and characterization of Africa, as a Continent in constant mutation, forming social and economic bases fundamental to human history
and its civilizing wealth.

At the same time, we will make a brief comparison of this historiography and its influence on textbooks, thus, we will be able to perceive how this process of historiographic evolution is present at the same time in our educational reality, on the
basis of its formation at basic and middle levels.

KEY WORDS
Africa, historiography, textbooks.

HISTORIOGRAFIA – UM DEBATE
Em relação ao debate, uma importante intervenção ocorre no texto de Jurandir Malerba, quando esta apresenta a seguinte concepção:
“Recuperando Beneditto Croce…a critíca poética critica a “poeticidade”, na critica historiográfica se avalia a “historicidade”, o que abre caminho para considerar a critica historiográfica como parte integrante da pesquisa histórica…encontramos no
texto do professor Masayuki Sato, da Universidade de Yamanashi, no Japão. Com ele aprendemos que além de considerações teórico metodológicas este debate precisa incorporar diferenças culturais, já que a história tem especificidades como ofício em diferentes culturais, além de distintos estatutos públicos (Malerba, Jurandir (org) in “A história escrita: teoria e históriagrafia”. São Paulo: Contexto, 2006.p.573.
Um dos aspectos presentes nesse trabalho dirige-se de encontro a algumas concepções de definições presentes nos textos acima, pois, os mesmos são consonantes com uma forma de observar e construir uma narrativa histórica.
Em primeiro lugar, temos uma necessidade de perceber o processo historiográfico, inserido em um amplo conceito cultural e social, não se pode perceber o oficio de um cientista como neutro, muito menos o historiador, pois, o mesmo –com suas variantes objetivas e subjetivas – é um ser inserido em um amplo conceito cultural e social.
De outra forma, uma concepção não neutra, não impede, muito pelo contrário uma apresentação onde o viés democrático do tema, do fato apresentado deve estar presente , debatido em outras palavras, o “outro”, faz e ajuda no processo de construção da análise
histórica, não só na análise do fato, mas na própria conceituação da intervenção histórica.
Em outras palavras, não existe ao historiador, uma unicidade verdadeira, ou pré – estabelecida, muito pelo contrário, a multiplicidade em debate, permite a construção de caminhos, sem neutralidade, porém, com sobreposição onde nem um lado ou vertente, se sobrepõem acima de qualquer um dos pontos de vista, o historiador, tem o seu em debate e isto não impede a apresentação ampla de todos os pontos. A realidade construída pela razão humana é o elemento decisivo, sem “verdades eternas”, ao
contrário: efêmera como é fugaz o processo do real dialético na construção de novas sínteses.
Por outra forma, perceber todo esse processo do ponto de vista objetivo e subjetivamente pressupõe saber aspectos epistemológicos desta ciência, o processo cultural amplia esse fator, ou, como afirma Croce “poeticidade”, do processo histórico, isto é, sua historicidade, como a narrativa da história é construída, um determinado local, esta é fruto das relações sociais e suas sínteses em geral correspondem ao pensamento dominante, quer seja da classe de domínio ou da síntese majoritariamente presente.
Um bom exemplo é o pensamento da escola positivista em nossa historiografia, o modelo do fazer histórico, uma epistemologia no período (final do séc. XIX e período inicial do séc. XX) primando pela base desenvolvida pelo filósofo francês “Augusto Conte”, pelas ideias “positivas” onde a neutralidade é um ponto fundamental.
Desta forma, em nossa Cultura histórica, a construção do “descobrimento” como narrativa foi até meados dos anos 80 predominante, isto pode ser constatado na própria escrita dos livros didáticos, em poucos abria-se a possibilidade de uma visão crítica em relação a concepção do “descobrimento”. A grande questão é justamente o papel do conquistador, predominante em nossa
historiografia, dos grande “heróis” e de toda uma narrativa apresentada onde se anulava o papel dos habitantes nativos, dos escravos e da população em geral, pois pareciaexistir a necessidade de desaparecer a vida cotidiana, deixando tudo para os palácios e
os príncipes resolverem em “brilhantes” qualificações.
Com o fim do regime cívico-militar, montado em 1964 e o processo de redemocratização o impacto em nossa historiográfico, foi justamente o de uma nova interpretação dos processos históricos o “outro’ estava finalmente presente, apesar de inúmeras dificuldades até mesmo do ponto de vista das pesquisas, de material de pesquisa etc.
Em um aspecto bem claro, teremos então a concordância com a concepção apresentada no texto de Croce “…a história tem especificidades como oficio” e identificar, construir
metodologicamente estes processos é o papel dos historiadores na construção de uma estrutura historiográfica, ou como apresenta Russen. “A teoria da história tem por objetivo analisar o que sempre foi a base do pensamentohistórico em sua visão cientifica e que, sem a explicitação e a explicação por ela oferecida, nunca passaria de pressupostos de fundamentos implícitos, pois, a construção do processo histórico é por demais complexo”.(2001.p.14)
Outra contribuição importante, esta contrária a todo escobo filosófico positivista, são as tradições culturais e orais, como parte da construção historiográfica e ao mesmo tempo, como parte integrante dos caminhos historiográficos, não é só perceber, como o roteiro, a narrativa de composição de uma historiografia de uma região.
Este pressuposto é mais amplo, ao incorporar elementos não escritos, como parte do processo historiográfico, compondo assim, elementos ao processo da historiográfia de uma região, esse desafio será a pesquisa, a procura, as conotações e as conexões possíveis da história.
É uma região composição, que vem corroborada na perspectiva presente de Mássimo Mastrogregori, no seu texto, ao analisar aspectos metodológico:
“em um aspecto metodológico aos estudos da historiografia …tomar um campo histórico mais amplo e que englobem uma produção fundamentada na “tradição” das lembranças, assim, “nas ações da memória e do esquecimento, de conservação e de destruição”.
O processo articulado de análise e composição de outros caminhos na abordagem historiográfica, desconstruindo a noção de exatidão, de registro, tão caro a importante escola positivista, abre um espaço maior para não só aceitação, mas um amplo respeito historiográfico a cultura popular, traço característico da sociedade e da cultura africana.
O grande erro é de não perceber aspectos mais originais de pesquisa e investigação ou mesmo querer se manifestar na classificação cultural tão somente pela estrutura do dado registrado, em outras palavras, escrito, sendo necessário não perder de vista o seguinte
elemento; a escrita não foi uma apropriação linear dos povos, isto é , no mesmo tempo histórico, de uma forma contrária, suas formas e variedades foram muitas ao longo da história humana, sem dizer das sociedades não letradas, mas possuidoras de uma cultura.

LEIS E ESTATUTOS DE ESTUDO: CULTURA AFRICANA

Sociedade brasileira em sua formação, em sua estruturação territorial nos processos posteriores da conquista portuguesa, no séc. XVI, foi marcada pela diversidade de várias etnias ocupantes do nosso território, uma dessas, foi justamente as dos povos originários do continente africano, segundo uma variável de fontes, entre 4 a 7 milhões de africanos vieram de uma forma compulsória, escravizados para o nosso país.
Em viagens terríveis, nos “navios negreiros”, onde muitos já chegavam mortos, foram separados de seus povoados, de suas regiões tradicionalmente ocupadas e secularmente ocupadas por seus antepassados, famílias foram separados, integradas forçadamente com outros povos do mesmo Continente, em regiões diferentes no aspecto climático e topográfico.
Mesmo assim, não abandonaram seus traços culturais resistiram e preservavam no mais variado aspectos, religião, costumes, estruturas produtivas trazidas da África, mesmo nas piores condições de sobrevivência possível, ao mesmo tempo, integraram-se em vários aspectos as culturas locais e tornaram possível uma construção social em vários aspectos única no sentido de resistência, disseminação cultural e idiomática, trazendo costumes maneiras novas de construção para novas realidades.
O processo de redemocratização do pais, pós período do regime cívico militar dos anos sessenta e setenta, permitiu com uma ampla adesão do movimento “Negro Unificado”, uma construção de resgate e de uma maior divulgação dessa importante cultura em
nossa sociedade, além de elementos, quer seja folclóricas ou “aceitos” pela cultura de senso comum das elites dominantes do país.
Embora a condição de “negro” em nosso país, ainda é um desafio para uma superação do racismo e da exclusão social que a comunidade afrodescendente sofre em nosso país, a preservação e apresentação de outros traços e a integração desta comunidade
(formadora da maioria de nossa população) é um elemento importante nas determinações de vivências e estudos.
O fato é o reconhecimento, por parte de importantes setores da sociedade civil objetivando determinam uma reparação, um reconhecimento a esta população aqui tão desprezada, estigmatizada em nossa sociedade, mesmo na forma de uma lei, o
reconhecimento deveria seguir seguido de outras formas, tais como, a obrigatoriedade do ensino da cultura africana e dos afro-descentes desde os primeiros anos escolares, com um amplo processo de esclarecimento e acolhimento por parte das instituições federais.
E assim, talvez nesse sentido, vieram os projetos leis, estes por sua vez, amparam todo um processo necessário, principalmente no campo educacional, pois, é necessário uma dinâmica de divulgação, das estruturas literárias, musicais, religião, dança e cultura em
geral, já nos primeiros anos de letramento.
Os aspectos objetivos de todo esse processo não acompanham de uma maneira rápida o conjunto da população, séculos de escravidão, o desprezo internacional, determinaram em nossa sociedade um camuflado estado de não preconceito, este aparece as vezes de uma maneira clara e violenta, principalmente nos segmentos policiais repressivos, de outra forma, a leitura subliminar desses atos desprezíveis preconceituosos surgem em nossa sociedade de uma maneira cotidiana no trato popular e acadêmico.

OS ARTIGOS – DECRETOS LEIS FUNDAMENTAIS

Em primeiro lugar é fundamental refletir sobre a diversidade étnica em nosso país, ao mesmo tempo, a riqueza cultural presente em nossa sociedade, sendo esta almejante da expansão do processo democrático necessita, sob a pena da lei, perceber como a etnia
dominante construiu sua história em nosso pais, apesar do sofrimento imposto.
“Por sua formação histórica a sociedade brasileira é marcada pela presença de diferentes etnias, grupos culturais, descendentes de imigrantes de diversas nacionalidades, religiões e línguas (…) (MEC/SEC, 1998).
O curso Educação – Africanidades-Brasil integra o conjunto de ações do programa de Ações de Educação Continuada de Ensino de História e Cultura Afro-brasileiras e Africanas, antiga reivindicação do movimento negro, que indicava a necessidade de qualificar professores para o efetivo trabalho com a temática História e Cultura afro-brasileira, incluída no currículo oficial da rede de ensino pela lei numero 10.639/03”p.9
Aqui poderíamos apresentar mais uma descrição no campo jurídico, assim, vamos aprofundando no aspecto jurídico e amparando pelos mesmos, reafirmando a necessidade de um amplo conhecimento sobre a cultura, a História e principalmente a historiografia africana e de como seus historiadores destacam seus processos de analise
configurando-se em variáveis epistemologias.
Os objetivos estabelecidos, pela Lei n 10.639/03, vem no sentido de completar a Lei n 9.394, de 20 de Novembro de 1996, pois ela obriga “a incluir no currículo oficial da Rede de Ensino a temática História e Cultura Afro-Brasileira, sendo importante sua
complementação; Resolução n1/2004, esta do Conselho Nacional de Educação (CNE) este aprovando o parecer CNE/CP3/2004 e na qual determina “Diretrizes Nacionais para a Educação das Relações Étnico Raciais e para o Ensino de História e Cultura Afro-Brasileira” desta maneira, torna-se obrigatória em outros níveis o ensino, o
conhecimento da História e Cultura Afro-Brasileira, ao mesmo tempo de uma maneira subjacente coloca-se como necessidade depender-se, perceba em grande parte, não só os aspectos culturais africanos em sí, como principalmente sua historiografia apresenta
uma montagem e caminhos epistemológicas.
Todo esse processo jurídico, não efetiva infelizmente um traço mais forte no processo psicossocial do conjunto social, o processo de ver, observar a maioria da população como pessoas “diferentes”, preconceituosamente, vive-se em uma sociedade preconceituosa sonhadora do mito da “democracia racial”, inexistente, onde o chamado “elemento de cor”, sempre será visto como escravo, um intrometido e na verdade um “outro” não podendo ocupar espaços da minoria branca dominante.
O processo das leis, não aplicadas, no seu necessário dever, faz escolas, faculdades, não apliquem os determinantes dessas leis, no limite ficando com as datas históricas, “Lei Áurea”, “Semana da consciência Negra”, onde os empregados ou os poucos estudantes
pretos são convidados para alguma exaltação, para depois voltarem aos seus serviços e trabalhos, pois para a mesma maioria que os governa esse é o seu lugar, a periferia da história.
As Diretrizes Nacionais para a Educação das Relações Etnicos Raciais precisam se tornarem reais em nosso campo educativo.

HISTORIOGRAFIA AFRICANA – PROCESSOS

“ Outra exigência imperativa é de que a história (e a cultura) da África devem pelo menos ser vistas de dentro, não sendo medidas por réguas de valores estranhos … Mas essas conexões tem que ser analisadas nos termos das trocas mutuas, e influencias multilaterais em que algo seja ouvido da contribuição africana para o desenvolvimento da espécie humana”.
J.\k.Zerbo – História Geral da Ásia – vol.I – p.LII – Universite d’ovagadongon A histografia e seus , caminhos narrativos, partindo do “como escrever” o processo histórico e seus acontecimentos uma relação tendo como partida os mais variados fatos, os aspectos culturais e sociais, no aspecto teórico a questão epistemológica, este
respaldo teórico está intrinsicamente ligado aos aspectos de uma realidade social ampla nos seus diversos fatores.
Existe um debate sobre como o termo escravidão, esta ligado ao continente africano, principalmente, em senso comum popular, onde a essência dos fatos não estão presentes, o próprio termo “escravo” é polêmico no sentido de desvelar sua origem, muitos defendem o ponto de vista na qual o termo escravo vem de um logo período da antiguidade, quando os povos eslavos eram levados para a Europa Ocidental por mercadores muçulmanos em geral, com a ocupação de Constantinopla pelos Otomanos as rodas de escravos, em geral povos eslavos, foram alteradas, fazendo com que os
comerciantes muçulmanos endossassem um processo de ampliação de escravos retirados da África.
Em pesquisas Lewis (1996), aponta três fontes de escravizados pelos muçulmanos:  Povos eslavos da Europa Central e Oriental, da qual deriva a palavra escravo.  Turcos da estepe euresiana, formavam o principal conjunto de escravos brancos no mundo islâmico, com a islamização dessa região, uma nova fonte foi
encontrada nas terras caucasianas. (obs.os muçulmanos não escravizam outros muçulmanos)  Os povos negros da África, a princípio constituem minoria, mas depois, sua importação torna-se maciça e o tráfico duradouro.
O processo é antigo no sentido de escravização da população africana, o processo se dá de uma forma esporádica ou isolada (Inikori – 2016) no Mediterrâneo antigo, a venda de escravos provenientes da África subsaariana:
“só no séc. IX ocorreu o desenvolvimento de forma significativa de escravos provenientes da África negra rumo ao resto do mundo”
(J.E.Inikori, in “Africa na História do Mundo: o tráfico de escravos a partir da África e a emergência de uma ordem econômica no Atlântico”- caput História Geral da África, volume V – Nações Unidas.)
No século XVI, várias fontes e pesquisas apontam a substituição de quase todas as outras etnias e religiões escravizadas na Europa
As perspectivas dos “sábios islâmicos” , dando um âmbito religioso (maldição de Canaã) recai sobre a população negra, com o peso hereditário essa condenação compreende tanto cor da pele como o processo de escravidão. No depoimento do historiador queniano Bethewell A. Ogot, afirma em relação a esta questão: “Teria sido no mundo islâmico, que a pele negra, se tornou símbolo de inferioridade e a África sinônimo de escravidão” (apud. Silvia, 2003, p.59)
As perspectivas dos “sábios islâmicos” no sentido de referendar um processo de escravidão, unindo aspectos bíblicos e necessidades comerciais, vai marcar todo um continente, a própria conquista no período das Grandes Navegações torna e referenda o sentido de “África & escravidão”.
No sentido de formulação historiográfico, das linhas e caminhos possíveis, como já foi aqui afirmado, não é possível separar o processo da realidade histórica presente, assim, o quadro de desestruturação, ou melhor, de tentativa de desestruturação, ou mesmo, de estigmatização social será fundamental para o entendimento dos caminhos historiográficos tomados, ou as necessidades fundamentais a serem superadas.
Alguns conceitos, temos facilmente utilizados como caracterização em uma região, assumem outras características e são fundamentais no sentido de se perceber como são necessárias serem rompidas para o encaminhamento da visão historiográfica a ser encaminhada.
No caso da África, é complexo o debate sobre os conceitos de “preservação de cultura”, a noção de “tribo”, “Estado e Nação”, por exemplo e os mesmos são decisivos no sentido de construção de um processo historiográfico, principalmente quando percebemos que as complexas estruturas étnicas e culturais dos povos africanos
preservaram-se, mesmo com o domínio e conquista dos muçulmanos ou da Europa cristã, o sentido de universalidade apresentada por estes povos, não derrotam a cultura e a riqueza étnica presente entre os africanos.
Este fato é presente na identificação e utilização do termo “tribo” , a estrutura tribal (conforme várias pesquisas históricas e antropológicas) não veem sentido para esta caracterização, principalmente quando o período imperialista dos séc.XIX e XX, por muito destacou uma concepção onde estava implícito o conceito “tribo x Civilização”, pois, por trás do conceito “tribo”, temos implicitamente, “grupos selvagens – primitivos”(Henriques,2004 – p.51/60 e Appiah,1977-p.155/192) e desta forma, hoje temos livros didáticos e historiadores trabalhando com o conceito de Nações e países em relação as populações africanas e suas ocupações espaciais, onde encontramos Nigéria (um pais) e Iorubás, estes no início do séc. XIX, não formavam um país.
A ocorrência de preservação das complexas estruturas étnicas e culturais, como já destacado, apresentam hoje a superação de tribo x civilização, substituindo por etinicidade e ou grupo étnico para classificar a população encontrada na África.
Este processo onde podemos classificar de nova postura, claramente esta ligado as novas correntes historiográficas do continente africano, as lutas de independência e de afirmação da Cultura e da população do continente negro, pois, apenas a presença mais
soberana das nações africanas podem justificar uma positiva mudança como esta, na realidade o mundo africano começa com as novas diretrizes historiográficas a passar por uma revisão onde o cerne será justamente o regate das suas formas organizativas e dos
dados culturais e sociais – econômicos vistos em novas condições.

AS DINÂMICAS HISTORIOGRÁFICAS AFRICANAS
O OLHAR DO CONQUISTADOR: PRIMEIRA ESCOLA

Este trabalho de analise sobre a historiografia africana, esta contextualizado por dois processo, o primeiro deles é uma pesquisa empírica com textos voltados ao campo histórico e filosófico de pensadores africanas, outro aspecto, o segundo é o mais teórico,
com base ao trabalho de Carlos Lopes “A pirâmide Invertida – historiografia africana feita por africanos (1944)”, situando as correntes historiográficas com base teórica neste
trabalho.
Não podemos perde de vista o processo socioeconômico, pois, será o mesmo a ditar as formas de escrever e construir uma narrativa de determinado momento e região, principalmente, do rico Continente africano.
Ao refletir o processo histórico, os caminhos historiográficos de meados do séc.XV ao início do séc. XX encontramos momentos e estes, não são distintos entre si, em primeiro, a II Revolução Industrial e suas consequências, entre elas a chamada
“racionalidade produtiva” , onde a necessária fraguimentação produtiva determinada por fortes investimentos no campo da ciência, desenvolvendo-a em processos jamais vistos em vários campos, na física, biologia, química etc.
Esse desenvolvimento, urbano – espacial, econômico, social e cientifico, consolidador do capitalismo em uma nova etapa monopolista, abre espaço no campo filosófico (sobre forte influência do Iluminismo francês do séc. XVIII) para a episteme positivista e o
surgimento das Ciências Sociais,em meio, aos debates fruto do pensamento Iluminista racionalista com forte influência na Europa, duas correntes se destacaram, de um lado o liberalismo e de outro o socialismo utópico e principalmente o cientifico, desenvolvido pró Marx e Engels, de certa forma, objetivando um caminho intermediário entre essas duas correntes revolucionárias advindas do Iluminismo, surge o positivismo de Augusto Conte.
Uma das características da reflexão positivista é uma busca ‘cientifica” para as Ciências Humanas, afastando-se do campo teórico e a pesquisa, encetando uma perspectiva similar as práticas das ciências naturais, do empirismo, afastando-se dos campos
teóricos especulativos, religiosos-mitológicos, metafísicos ou mesmo subjetivistasidealistas (Kant, Hegel etc).
Nesse sentido o documento histórico se sobrepõem a tradição oral, aos processos culturais movidos por uma tradição de costumes ou mitológicos religiosos, ao mesmo tempo a sofisticação industrial, quer seja, no campo das armas ou da indústria produtiva
pressupõem uma nova divisão internacional de trabalho, e há dois fatores novos e urgentes, a exportação de capital (acumulado com a monopolização capitalista) e a necessidade de globalizar o processo produtivo, principalmente das fontes minerais e assim, Congressos (via diplomática) ou “guerras de conquistas”, aspectos ideológicos
eugenistas, o dawismosocial, determinam uma politica imperialista em vários Continentes em especial o africano. Aqui percebemos como é construída a primeira corrente da historiografia africana, pois será uma história estruturada pelo dominador europeu, como por exemplo, na Fundação da Société des Africanistes, em Paris, no ano de 1930, temos os antropólogos Paul Rivet, Lévy-Bruhl, Marcel Mauss e Marcel Griavle e os linguistas, Marcel Cohen e Antoine Meillet, junto a estes, temos os chamados “velhos africanos”, assim tratados de uma forma carinhosa.
Quem seria esses “velhos africanos”? O termo já indica alguma coisa, estes seriam fruto dos projetos neocoloniais imperialistas, desenvolvido ao longo do século XIX e principalmente nas primeiras décadas do séc. XX.
Isto se reflete no primeiro presidente da Sócieté, o General Henri Gouraud,(1867 – 1946) este famoso na repressão da revolta ocorrida na Guiné, em particular pela prisão e morte do líder revoltoso Samory Touré, na verdade Gouraudum importante militar,
conquistador no norte da África da Síria e outras regiões, tais como o Líbano, simboliza bem esta primeira corrente historiográfica, conhecida como “corrente da inferioridade africana”, nas obras surgidas nas primeiras décadas do séc. XX, segundo, Carlos Lopes:
“…os traços são bem característicos, onde temos uma ideia central : povos africanos por desconhecerem a escrita (o que é falacioso) não teriam história própria”.
As características das analises, ressaltam bem o período de conquistas militares e exploração territorial-econômica, será o que ficou conhecido como “difusionismo”,
sendo o difusionismo assim classificado fora do Continente, outro membro da burocracia colonial terá um papel importante nesse processo, trata-se de Maurice Delafosse (1870 -1926), encarregado dos assuntos culturais africanos na administração do Sudão, sendo também considerado “pai” dos africanistas franceses, este no seu
estudo da formação cultural/histórica dos povos sudaneses, Delafosse recusa ver a comunidade negra africana como construtora de uma civilização como ocorre no reino de Gana. No olhar deste colonizador, Gana e sua civilização serão obra de outros, brancos, judeus, sírios, imigrantes de Cartago, porém, Delafosse não esta sozinho, encontramos G. MC. Call Theal, no seu livro “History of South África (1888 – 1919 – 5 volumes) ocorre uma verdadeira celebração da política colonialista branca britânica, defendendo uma concepção racista muito utilizada no período do Apartheid, onde é apresentado a concepção da chegada de bancos e negros de uma maneira simultânea na África Astral.
Como uma relação intrínseca ao imperialismo vigente no Continente no período, o “racismo cientifico” concebia como:
“povos selvagens, povos infantis e a oposição entre: selavagem e colonizados, civilização e bárbarie e África : fardo do homem bravo”.
Para Philip Mitchell (1950), governador inglês do Quênia “ a colonização é acompanhada uma missão civilizadora”, como fala aquela piada, “faltou combinar com o outro lado”, de certa forma essa será a estrutura de como será contada a história da África, toda uma historiografia narrada pelo conquistador.
O que chama atenção é justamente a aceitação dessa visão historiográfica, de uma forma conjunta, esta é presente em um momento de total sintonia com a realidade política e econômica internacional do período, existe sempre a ideia dos povos africanos como ad social, onde os europeus superiores, com uma cultura mais “avançada’ tem um papel “salvador” e assim portadores de uma “verdade absoluta” onde a Cultura dos povos militarmente dominados não tem nem um valor, muito ao contrário, está é
completamente estigmatizada como total incompetência, mesmo porque a mesma não apresenta um caráter de escrita como um possível “marco civilizatório”.
E a grande questão aqui esta presente, ou seja, Civilizaçao para quem? Na verdade aqui temos um exemplo concreto da ideia de hegemonia e domínio ideológico trabalhado por Gramsci, para o pesador italiano, morto em 1937, o processo de ‘hegemonia cultural’ se manifesta no campo ideológico, quando, “os interesses de uma classe dominante sofrem uma identificação aos interesses de toda a sociedade”, nesse momento da historia da África, o interesse por parte dos impérios colonialistas é o justamente este, efetivar uma dominação “civilizatória”, isto é, já partindo do principio da não existência de uma civilização, de sociedades organizadas, segundo o padrão eurocêntrico do período, na verdade como em outros tempos em outras regiões aqui nas Américas, essa visão totalizante será a justificativa (ideológica) para a destruição e morte de milhares
de pessoas.

A SEGUNDA ESCOLA: UMA REAÇÃO – O AFROCENTRISMO

O final dos anos cinquenta (no auge do processo de descolonização iniciado com a decadência econômica dos países colonialistas ao fim da II Guerra Mundial – 1945), uma nova corrente historiográfica apresenta-se, contrapondo-se ao pensamento historiográfico pelos colonizadores.
Entre os anos 60/80 do séc. passado, surge esta nova corrente, opondo-se ao pensamento da “inferioridade africana” e ao “divisionismo”, assim, denomina-se “corrente da Superioridade Africana”, o processo político e as transformações sociais no
marco das lutas nacionalistas foram determinantes no processo dessa nova corrente historiográfica, com uma alta valorização cultural e das sociedades africanas.
Ao mesmo tempo, o papel desta corrente é justamente inverter a situação anterior, não é um fácil desafio mas rico em perspectivas, assim, abrindo um debate sobre a importância da cultura e a tradição africanas como determinantes do mundo Ocidental e
Oriente Médio, resgatar esse processo, é refundar a história da trajetória civilizatória da humanidade em vários sentidos.
Nesta escola historiográfica, mais próxima e retomadora da riqueza da cultura africana em vários aspectos, apresentando sua originalidade, nos campos filosóficos, sociológicos, antropológicos entre outros, podemos ampliar o diálogo de várias frentes
das ciências humanas e destacamos os seguintes intelectuais:
– Cheikh Anta Diop (1923/1986)
– André Lerói – Gourhan (arqueólogo)
– André Aymardi (historiador)
-Gaston Bachalard (filósofo)
Em alguns textos, Diop, defende uma visão bem anticolonial e de valorização da cultura africana em seus vários aspectos, partindo dos seguintes pressupostos:  Ênfase na anterioridade das civilizações negras (1954)  A necessidade de uma identidade racial e cultural dos povos negros.
Estes tópicos estão presentes nos seguintes trabalhos,  Nations Négres et Culture (1954)  L’Unité Culturalle de l’ Afrique Noire (1960).
O caráter restaurador e principalmente ousado, no sentido de recuperar e construir uma narrativa onde o orgulho pela construção histórica civilizatório africano esteja presente ressaltando o em varias áreas do conhecimento e da tradição cultural vai influenciar em muito o próprio cotidiano de luta e de exaltação das lutas populares, exemplo é o que ocorre no movimento anti-aparthaid na África do Sul, Hosea Jaffé Mnguni e a missionária Dora Taylor, foram nessa conjunção de revisão, colocando em questão a
legitimidade da colonização inglesa.
Em 1956, um congresso patrocinado pelo governo da Tanzânia teve como tema central,”…a busca da especificidade e autonomia da experiência histórica africana”, já na palestra inicial, o historiador Engelbet Mveng, da Universidade Federal de Yaoundé, de Camarões, afirmou:
“A África tem o dever de afirmar a autenticidade do seu passado, não em virtude da imagem criada pelo observadores estrangeiros, mas em virtude da verdade daquilo que foi vivida, experimentado e expresso por ela mesma” (Mveng, 1971, p.17)
A busca por um processo autônomo é o grande diferencial, reconstruir seu processo identidade própria e o mais importante, apresentar a rica diversidade, onde o dever de afirmação e o regate uma autenticidade de um passado, como dinâmica de desenvolvimento para uma original abordagem historiográfica.
O processo de uma perspectiva autônoma esse é o grande diferencial, assim reconstruir o seu processo de identidade própria e o mais importante, apresentar a rica diversidade no sentido de sua importância enquanto formadora de toda a dinâmica cultural
encontrada em África.
Em vários momentos os pensadores dessa corrente historiográfica determinam de uma maneira mais clara suas intervenções no sentido de corrobora com a linha adotada, é o exemplo desta passagem de Diop, citado em:
“ A qualidade dos gestos e atitudes, a maneira de abordar as coisas, seja qual for a casta, é senhorial, aristocrática, por oposição a “mesquinharia” burguesa. No que tange ao comportamento, toda uma revolução separa a consciência africana da Ocidental. Estas sequelas de aristocratismo não teriam desaparecido nem mesmo se o africano, no decurso de sua história tivesse assumido ele próprio seu destino nos quadros de um regime republicano. E a colonização Ocidental republicana não pode modificar esse traço” (Diop,1987 – p.74).
O interessante é perceber como o processo determinante da corrente é defendido, mesmo se em algumas situações o rompimento se torna mais complexo, esse processo restaurador foi acompanhado por um momento especial do Continente, pois, margearva-se a estrutura de Independência de várias regiões e fica imperioso recusar a estrutura historiográfica anterior onde dominadores escreviam sob sua ótica conquistadora a história.
Já o trabalho do historiador Hosea Jaffé (1921-2014) integra-se nesta escola, no sentido em que apresenta pontos polêmicos, principalmente em relação ao pensamento de esquerda eurocêntrico, em particular revisando pontos da teoria marxista, em relação a África e os seus modos de produção. Jaffé, questiona da necessidade do capitalismo na região, apresentado a luta de um “modo de produção” x outro “modo de produção (nativo)”, e neste processo de análise questiona o próprio sentido de “desenvolvimento”, possível nas estruturas produtivas capitalistas, ao negar o processo “progressista” do capitalismo, o autor defende a tese de o sentido de “progresso” do capitalismo trás de uma maneira subjacente a necessidade do colonialismo.
“…capitalismo ao estender suas práticas de exploração, por sua natureza, determina uma hierarquia de centros de desenvolvimento organizados em uma cadeia com conexões que tornam o subdesenvolvimento outra parte necessária do desenvolvimento,
assim, o capitalismo não é progressivo, mas antagônico ao desenvolvimento humano” (Jaffe-2010).
Desta forma, o modo de produção capitalista é classificado pelo historiador e economista sul africano, como “peculiar” da Europa Ocidental, seu sentido de desenvolvimento e “progresso’,  pressupõem uma “universalização” e está traz implícito o sentido de colonialismo.
O que é peculiar na obra, corroborando pelo sentido mais amplo da segunda escola historiográfica, a procura de resgate de um modo de produção “comunitário trabalhista”, a comunidade “despótica”, na forma de governo e suas fragilidades, pois, ao destruir o modo de produção existente, existe de uma forma correlata a construção de
um sutil processo de cooptação, o mecanismo é indireto, as elites locais são induzidas ao processo de colaboração com o “progresso”, destruindo seus mecanismos sociais e políticos e adaptando-se ao estilo de vida do Ocidente.
O processo evolutivo do capitalismo pressupõem o atraso necessário da região dependente e sistematicamente, com a colaboração de uma elite local, a continuidade do atraso para a região dominado, a implementação de um perceber racista e dominador em relação as regiões exploradas.
Um dos ataques a crítica marxista de Jaffé será justamente em um ponto muito sensível aos pensadores africanos da segunda vertente historiográfica:
“Marx não entendeu que o capitalismo não curaria, mas renovaria a divisão do trabalho do mundo implementada pelo sistema colonial”
“…a raiz da contradição está na maneira de conceber o “progresso” que parte do preconceito segundo o qual todo novo “modo de produção” se firma como negação da negação e é necessariamente superior ao anterior.
Jeffe, pelo contrário pensa que toda situação deve ser julgada em relação a melhoria real e histórica concreta das condições da maioria.
Essa melhoria radical e o que quer que isso signifique (como disse Gunder Frank) é o único ponto de vista possível…” (Jaffé – 2010)
O impacto do debate e as questões suscitadas pela nova vertente historiográfica, no campo historiográfico expandiu-se para outras áreas e vice-versa, ao fundo o questionamento em relação a uma visão dominadora do mesmo modo de sua ação real concrete de extermínio físico, desta forma, exterminadora dos meios culturais e
científicos dos povos africanos e porque não, de outros continentes.
Na perspectiva do desenvolvimento de novas pesquisas arqueológicas vão desmentir várias certezas apresentadas pelo conquistadores neocoloniais, a racionalidade produtiva, a Divisão Internacional do Trabalho e Produção, acompanha todo o processo
de “progresso” apresentado pelo capitalismo, pressupondo portando, dois fatores, em primeiro a necessária super exploração dos povos dominados e a consequente dificuldades para romper o processo exploratórios e intercalando esse processo, a destruição da cultura local, não só em termos produtivos, em termos culturais
fundamentalmente.
Essa nova visão, de resistência e procura de autonomia ganha um novo impulso ao partir de intelectuais formados no continente, apresentando continuidade e novos elementos para análise e construção de novas perspectivas.

TERCEIRA VIA HISTORIOGRÁFICA : TENDÊNCIAS RECENTES

Algumas caraterísticas, são próprias dessa nova vertente nos marcos historiográficos africanos, existe alguns marcos de continuidade, tais como a integração de vários campos das ciências humanas, outro é perceber a cultura e as sociedades africanas não de uma maneira homogênea, processo esse interessante, respeitando as ricas diversidades dos povos do continente africano.
Outro ponto importante é a construção enquanto tentativa no sentido de superar as duas correntes, tanto a euro centrista com visão do colonizador, como a afro centrista, isto é,
não está nos seus horizontes ser apenas uma historiografia “anticolonial”, como resultantes de intelectuais formados na África, tem uma preocupação maior com o pluralismo, com as possibilidades de se perceber um processo dialético na construção de uma síntese mais aberta.
Um bom exemplo dessa escola é o do professor – historiador Elikia M’Boko, educador do Centro de Estudos Africanos da École des Hautes Études em Sciencies Sociales, Paris, participantes de revistas e programas de rádio e tv, difundindo a cultura africana, em seu livro “Afrique noire – Historie et Civilizations” (África Negra História e Civilização), não encontramos roteiros pré estabelecidos de datas e eventos, o processo de análise nos leva ao encontro de “tipologias das formações sociais”, com acerto de estruturar na analise a variedade dos povos e das culturas africanas e ao mesmo tempo, identificando o processo externo a esta cultura, quer seja muçulmana ou cristã, e o processo de africanização das mesmas.
Outra questão importante, será a falta de vínculos com estruturas mais “fechadas” do ponto de vista ideológico, reconhecem a importância deste conceito, utilizam em vários aspectos uma perspectiva crítica, radicalizada, por exemplo, em entrevista M’Bokolo, in “Cultura – Revista da História e Teoria das Ideias”, entrevista coordenada por Catarina Madeira Santos e Ângela Barreto Xavier (https://doi.org./10.4000/cultura.903), as autoras no prefácio deixam claro:
“…Mais do que as peripécias do tempo presente e a sua interpretação, interessa-lhe compreender o conjunto dos fenômenos de longa duração – permanências e recorrências, rupturas e inovações, captações e reapropriações – na sua interação com
as dinâmicas contemporâneas.
Na fala de M’Bokolo, encontramos: “…existem processos e a África está em movimento – vem de um lado e segue em outra direção – e que, portanto, em traços largos, tenha sido gloriosa, depois fora dominada e agora estava talvez a recomeçar.
…quando chequei em Paris, Césaire escreveu “Une Saison au Congo”, a famosa peça de teatro sobre a queda de Lumumba e a chegada de Mobutu. Portanto, havia ali uma responsabilidade em relação ao presente que me parecia mais interessante que esta
espécie de nostalgia em relação ao passado que não era muito criativa, do meu ponto de vista (sob a desconstrução histórica) “…Então não tardou que nós próprios continuássemos essa desconstrução , procurássemos desconstruir os conceitos, mas destruir também a cronografia da História pré-colonial e da História colonial, pós colonial. Procurar pelo contrário, os lugares onde as coisas se entrelaçam e, no fundo, encarar o estudo de África pelas sociedades africanas, tal qual elas se produzem e se transformam no
tempo, com ou sem contato com o mundo exterior. Não se trata de uma história que seja anti colonial, isso não faz sentido, é uma história na qual se fazem entrar todos os processos que estão em presença.”
(Sob, Ideologia e História) Afinal, como é que se passa esta relação entre ideologia e História?
Desde o início que eu sempre gostei de erudição; quer dizer, os debates de ideias etc são interessantes, mas, quanto a mim, o nosso metier, deve ser fundado sobre um mínimo de erudição: as fontes e o seu tratamento , a discussão sobre as cronologias, etc. É a partir daqui que se podem construir discursos .Portanto, quanto ao império das ideologias , eu sempre pensei que temos necessidades de ideologias, mas quando estamos em nosso métier, é preciso deixa-la a porta, para verdadeiramente exercer o exercício de historiador . E isto chega a criar problemas com jovens africanos, quando lhes digo: O que tu dissestes passa bem num meeting, eu te aplaudiria, mas num texto de história não passa, porque o que te permitiria afirmar isso não está ai.
Nesta longa e necessária intervenção os traços dessa terceira vertente estão presentes, na voz de um dos seus mais importantes representantes, no sentido de fazer um contraponto com as duas correntes anteriores, os intelectuais africanos contemporâneos
objetivam um novo caminho, onde as dinâmicas ideológicas estão presentes, porém estas não são fundamentais em todo o processo de caminho.
Outro aspecto importante, e dentro deste pode-se compreender mais facilmente as relações com as ideologias, quando observamos um dado da realidade, do concreto real, ocorrido, quer seja no passado ou no presente, percebemos muito de uma maneira
subjetiva, onde campos emocionais e ideológicos estão presentes em julgamentos, porém, estes não pode ser julgados de uma maneira uniforme, nem todos assumem os mesmos aspectos de julgamentos, linguagens e narrativas. No caso de África, existem “várias Áfricas” , como a África muçulmana, do Egito e do Magreb, a sudanesa, a
África Oriental com a cultura suaíli, os Bantos, a diversidade é muito grande, não se enquadra em um padrão, como já foi ressaltado :
“nas nossas operações de analise, interessam tanto os grandes quanto os pequenos Estados, as formações sociais predominantes e as que são minoritárias e mesmo especifica de um povo. Assim, nessa perspectiva de estudo, a ênfase não está mais numa suposta “identidade africana” como se a África comporta-se uma realidade
homogênea , o que se procura é identificar as várias Áfricas,  considerando a diversidade ambiental (a África mediterrânea, saariana, subsaariana, das savanas e das florestas e a diversidade étnico cultural…” (ob. Cit. p. 19)
Não podemos esquecer a concepção ampla, trás de uma maneira subjacente, uma dinâmica ideológica dominadora, seus conflitos e seus encaminhamentos, a diversidade deve ser respeitada, aqui podemos encontrar vários pontos da entevista de M’Bokolo,
por exemplo, pois as especificidades importam.
Essa escola desbrava evidências arqueológicas, aspectos fundamentais da chamada “história oral”, pois ali encontramos elementos fundamentais de uma especificidade cultural e social, presentes no Continente Africano.

LIVROS DIDÁTICOS UMA BREVE PESQUISA

O processo de apresentação do Continente Africano no campo didático, foi feito de forma não abrangente, pois, em geral, poucas peculiaridades diferenciadoras são apresentadas, o campo informativo é muito rico, este é um bom sinal, pois de alguma
forma a riqueza e a luta do povo africano esta presente, um bom exemplo é a coleção “Projeto Araribá História –Ed. Moderna-vol.7ano,nível básico) onde o encontramos os versos de José Craveirinha, (1922 – 1930) um dos mais importantes poetas
moçambicanos.
“Hino á minha terra”
Marrupa, Michafutene e Zóbuê e apanho as sementes do cutilho e a raiz da txumbula E mergulho as mãos na terra fresca de Zitundo,
Oh! As belas terras do meu áfrico país e os belos rios e os belos lagos e os belos peixes e as belas aves dos céus do meus país e todos os nomes que eu amo belos na língua ronga, macua, suaíli, changana, xítsua e bitonga dos negros de Camunguine, Zavala,
meponda, Chissibuca Zongoene, Ribáuè e Mossuril (…)”
Cravinha, José, in Silva, Kislana Rodrigues Ramos, “Resistência.

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